Este não é um guia definitivo sobre condições tireoidianas, mas sim um pontapé inicial para algumas das questões mais comuns, bem como uma forma de, a partir dele, novos questionamentos e dúvidas surgirem e, cada vez mais, disseminarmos conhecimento sobre o tema.
O que é?
A tireoide é uma glândula endócrina localizada na região cervical anterior, ao nível da quinta vértebra cervical, com peso médio de 25g (ligeiramente maiores no sexo feminino). Em forma de “H”, possui lobos direito e esquerdo, unidos ao meio pelo istmo. Ela é responsável pela produção de hormônios, mais notadamente triiodotironina (T3) e tiroxina (T4), envolvidos na regulação do nosso metabolismo. Outro importante hormônio produzido pela tireoide é a calcitonina, um dos responsáveis pela normocalcemia.
Quais são as principais alterações dessa glândula?
Em linhas gerais, temos patologias morfológicas e funcionais da tireoide, que podem estar correlacionadas ou não. Em relação à morfologia, podemos ter aumento global, redução global ou aumento focal (cistos e nódulos). Já quando a questão é funcional isso se dá na forma de hipo ou hipertireoidismo. Um exemplo de sobreposição morfológica e funcional é o adenoma nodular tóxico, causando hipertireoidismo (Doença de Plummer), em que um aumento focal da glândula é responsável por maior produção de hormônios tireoidianos.
Principais causas de hipertireoidismo:
- Doença de Graves (autoimune);
- Adenoma nodular tóxico;
- Hipertireoidismo transitório gestacional;
- Induzido por fármacos (ex.: amiodarona);
- Tireoidite de de Quervain (viral).
Principais causas de hipotireoidismo
- Tireoidite de Hashimoto (autoimune);
- Deficiência de iodo (endêmico);
- Induzido por fármacos (ex.: amiodarona, lítio);
- Remoção cirúrgica da glândula.
Fatores de risco para carcinoma de tireoide:
- Incidência familiar;
- Exposição a radiação.
Sintomas
Geralmente assintomáticos, os nódulos tireoidianos passam a se apresentar clinicamente quando o seu volume se torna maior. Os sintomas mais comuns são massa cervical visível/palpável, dispneia (dificuldade para respirar), principalmente ao se deitar, disfagia (engasgo). Hemoptise (tosse sanguinolenta) e rouquidão são exemplos de sinais de alarme para malignidade.
Já em relação à sua função, o hipotireoidismo se dá na forma de astenia (fraqueza), ganho de peso, constipação intestinal, cabelos e unhas quebradiços, sonolência. Insônia, taquicardia, perda de peso, exoftalmia (globo ocular protruso), diarreia são sintomas do hipertireoidismo.
Diagnóstico
Os distúrbios funcionais da glândula são investigados a partir de exames de sangue, principalmente o TSH (tireotropina). Esse hormônio, produzido na hipófise anterior, é responsável pelo estímulo à produção de T3 e T4, esses responsáveis pela regulação do metabolismo corporal.
Abaixo, interpretação dos exames laboratoriais geralmente solicitados para avaliação das afecções mais comuns:
Em relação aos nódulos tireoidianos, o passo inicial geralmente é caracterizar sua morfologia, com base em ultrassonografia. A partir desse exame, indica-se seguimento com avaliações seriadas ou punção aspirativa para análise citopatológica.
Tratamento
Há uma vasta gama de tratamentos para doenças tireoidianas, visto que essa glândula pode ser acometida das mais diversas condições. Aqui abordaremos as principais condutas para os problemas mais comuns.
O manejo do hipotireoidismo autoimune geralmente se dá a partir de reposição hormonal via oral, na forma da levotiroxina, que deve ser tomada pela manhã, em jejum. A principal falha desse tratamento está justamente relacionada à sua administração, quando o paciente por vezes não respeita o jejum ou ingere o comprimido em conjunto com outras medicações.
A doença de Graves, afecção mais comum relacionada a hipertireoidismo, pode ser tratada de três formas: drogas antitireoidianas, terapia com iodo radioativo ou cirurgia, cada uma com prós e contras específicos, sendo essa decisão tomada em conjunto com o paciente. De forma simplificada, a tabela abaixo mostra alguns pontos em que nos baseamos para optar ou não por algum tratamento:
Em relação aos nódulos, podemos optar por conduta expectante ou intervenção definitiva, baseado em ultrassonografia e punção aspirativa, esta quando indicada. Quando falamos sobre nódulos benignos, a indicação cirúrgica vem na presença de sintomas compressivos locais. Para nódulos menores, sabidamente benignos, podemos indicar ablação por radiofrequência ou alcoolização. Já nos casos malignos, a conduta mais amplamente aceita é a tireoidectomia, seja ela parcial ou total, seguida ou não por iodoterapia e supressão hormonal, essas duas últimas decididas com base em estudo anátomo-patológico.
Curiosidades
· A tireoidectomia era tida como um procedimento de morbidade e mortalidade elevadíssimas até o final do século XIX, sendo fortemente desencorajada sua realização, até o momento em que Emil Theodor Kocher sistematizou tal cirurgia, reduzindo o óbito operatório a taxas menores que 1%. Esse trabalho garantiu ao médico suíço o prêmio Nobel de Medicina, em 1909;
· O fluxo sanguíneo tireoidiano por minuto chega a ser 5 vezes maior que seu peso;
· Para se prevenir doenças tireoidianas causadas por deficiência de iodo, o sal de cozinha é suplementado com uma parte de iodeto de sódio para cada 100.000 partes de cloreto de sódio;
· A palavra “cretino” é o adjetivo daquele portador de “cretinismo”, que nada mais é que a agenesia da tireoide, acarretando graves alterações no desenvolvimento neuropsicomotor ainda na infância;
· A palavra “tireoide” recebia acento agudo (“tireóide”) até a vigência do novo acordo ortográfico, em 2009, que excluiu tal grafia em ditongos abertos “ei” e “oi”;
· Um questionamento muito comum no consultório é sobre o aumento na incidência de câncer de tireoide no Brasil e no mundo. Aparentemente, a maior facilidade no acesso a exames de imagem, principalmente ultrassonografia, parece ter relação direta com esse fato. Portanto, provavelmente estamos fazendo mais diagnósticos, mas a presença de nódulos tireoidianos na população é a mesma;
· Aproximadamente 60% das mulheres em idade fértil possui nódulo tiroeidiano;
· A maior parte dos laboratórios considera um jejum de 3h ideal para coleta de TSH/T4 livre.
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